Aposentadoria do Servidor Público e a extinção do vínculo com a administração pública

A Emenda Constitucional nº 103, de 12/11/2019, publicada no Diário Oficial da União em 13/11/2019, trouxe importantes inovações no sistema de previdência social. Dentre elas, alterou o § 14 do artigo 37 da Constituição Federal, no que diz respeito à aposentadoria e o rompimento do vínculo entre o servidor e a administração pública. Dispõe a referida norma:

Art. 37. ………..

§ 14. A aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inclusive do Regime Geral de Previdência Social, acarretará o rompimento do vínculo que gerou o referido tempo de contribuição.

A regra acima transcrita não se aplica a aposentadorias concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social até a data de sua entrada em vigor, ou seja, 13 de novembro de 2019 (art. 6º c.c. art. 36, III, da EC 103/2019).

Desse modo, a partir de 14 de novembro de 2019, aquele servidor público que tiver concedida a aposentadoria se utilizando de tempo de contribuição de cargo, emprego ou função pública que ainda ocupe, terá extinto esta relação de trabalho mantida até então com a Administração Pública e será exonerado.

Para os servidores públicos em geral, no tocante aos ocupantes de cargos públicos e aqueles que mantém relação estatutária com a Administração Pública e a regime previdenciário próprio, nesse aspecto, a EC 103/2019 não trouxe mudanças significativas, pois tradicionalmente, com a aposentadoria, há a quebra do vínculo com a Administração Pública e a consequente vacância do cargo.

Em contrapartida, aos empregados públicos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e vinculados ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), a mudança é impactante e altera o status quo ante, eis que as relações jurídicas de direito do trabalho e de direito previdenciário não possuíam um elo que vinculasse a aposentadoria à extinção do contrato de trabalho, sendo antes independentes e desvinculadas as situações. Agora, o cenário é outro.

É bom deixar claro que nas relações de âmbito privado não há qualquer mudança. Portanto, nesse contexto, com a aposentadoria voluntária do empregado, mantém-se o vínculo empregatício com o empregador, sem afetar o contrato de trabalho, pois o direito à aposentadoria previdenciária é oriundo de uma relação jurídica entre o segurado do Sistema Geral de Previdência e o Instituto Nacional de Seguro Social. A mera concessão da aposentadoria voluntária ao trabalhador não tem por efeito extinguir, instantânea e automaticamente, o seu vínculo empregatício (STF – Rcl 36983 / ES – ESPÍRITO SANTO; Relator(a): Min. EDSON FACHIN; Julgamento: 25/10/2019).

Importante lembrar que antes do advento da EC nº 103/2019, havia discussão quanto à validade de lei local ou estatuto que previsse o rompimento do vínculo empregatício com a aposentadoria do servidor público. O Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que se há previsão na lei local de que a aposentadoria é considerada causa de vacância, não há como o servidor reingressar no mesmo cargo, senão através de novo concurso público.

Eis algumas decisões nesse sentido:

Ementa: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDORA PÚBLICA ADMITIDA NO REGIME CELETISTA, POSTERIORMENTE CONVERTIDO EM ESTATUTÁRIO. EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO DE PROVIMENTO EFETIVO. APOSENTADORIA VOLUNTÁRIA PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. HIPÓTESE DE VACÂNCIA DO CARGO, SEGUNDO A LEGISLAÇÃO ESTADUAL. PRETENSÃO DE RETORNO AO CARGO, AO FUNDAMENTO DE QUE A APOSENTADORIA PELO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL – INSS É CUMULÁVEL COM OS VENCIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE REINTEGRAÇÃO AO MESMO CARGO PÚBLICO APÓS APOSENTADORIA, SEM APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. 1. A legislação estadual dispõe que a aposentadoria é causa de vacância do cargo público, o que determina o afastamento do servidor dos quadros da Administração. 2. O acesso a cargos públicos rege-se pela Constituição Federal e pela legislação de cada unidade federativa. Se o legislador estadual estabeleceu que a aposentadoria é causa de vacância, o servidor não pode, sem prestar novo concurso público, ser reintegrado ao mesmo cargo depois de se aposentar. Com efeito, antes mesmo da EC 20/1998, quando não havia a vedação de acumulação de proventos com vencimentos de cargo público, esta CORTE já proclamava a inarredável necessidade do concurso público para o provimento do cargo público após a aposentadoria. Precedentes. 3. No caso em análise, a servidora intenta ser reintegrada no mesmo cargo após a aposentadoria, sem se submeter a concurso público, o contraria a jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 4. Além disso, a orientação jurisprudencial desta SUPREMA CORTE firmou-se no sentido de que a acumulação de proventos e vencimentos somente é permitida quando se tratar de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela Constituição (RE 163.204, Rel. Min. CARLOS VELLOSO). 5. Agravo Interno ao qual se nega provimento. (ARE 1231507 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 29/11/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-274  DIVULG 10-12-2019  PUBLIC 11-12-2019)

Ementa: SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. MUNICÍPIO DE VAZANTE. AUSÊNCIA DE REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. APOSENTADORIA DE SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL PELO REGIME GERAL. VACÂNCIA DO CARGO PREVISTA EM LEI LOCAL. IMPOSSIBILIDADE DE REINTEGRAÇÃO AO MESMO CARGO PARA ACUMULAR OS PROVENTOS E A REMUNERAÇÃO DELE DECORRENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – Aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social e prevista a vacância do cargo em lei local, o servidor público municipal não tem direito a ser reintegrado ao mesmo cargo no qual se aposentou a fim de acumular os proventos e a remuneração dele decorrentes. II – Majorada a verba honorária fixada anteriormente, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, observados os limites legais. III – Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 1063705 AgR- segundo, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 29/05/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-140 DIVULG 04-06-2020 PUBLIC 05-06- 2020).

De qualquer modo, para aqueles que queiram se aposentar e são servidores públicos, é aconselhável sempre consultar seu advogado para analisar a sua situação em particular e seus direitos.

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